OPINIÃO: BRMX Analytics avalia segunda etapa do Brasileiro de Motocross 2014, realizada em Pedra Bonita, Minas Gerais

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avalia segunda etapa do Brasileiro de Motocross
Pedra Bonita será lembrada pra sempre como “a corrida do helicóptero” – Foto: Mau Haas / BRMX

 

O BRMX Analytics está de volta para fazer uma análise dos pontos positivos e negativos da segunda etapa do Brasileiro de Motocross 2014, realizada em Pedra Bonita, Minas Gerais, nos dias 31 de maio e 1º de junho.

Depois de uma prova bem organizada na abertura do campeonato, o evento de Pedra Bonita foi bastante conturbado, a exemplo do que aconteceu no ano passado em Lauro de Freitas, Bahia, e Foz do Iguaçu, Paraná, quando provas e treinos tiveram que ser cancelados por falta de segurança.

Vamos aos detalhes, destacando pontos positivos (sim, existiram) e negativos. Repare que os dois primeiros itens refletem diretamente no terceiro, a segurança.

 

:: Localização

 

Os problemas da segunda rodada do Brasileiro de Motocross 2014 começam com a dificuldade de acesso a Pedra Bonita. A dificuldade para chegar (e até mesmo para encontrar) a pequenina cidade (tem cerca de seis mil habitantes) assustou pilotos, dirigentes, público, etc.

Em distâncias, Pedra Bonita está bem localizada. Cerca de 260 Km ao leste de Belo Horizonte, aproximadamente 300 Km de Vitória, Espírito Santo, e a 380 Km do Rio de Janeiro, capital. Mas o acesso é muito ruim.

É preciso percorrer a BR-262 e depois pegar uma estradinha sinuosa por mais 30 quilômetros. Ou então enfrentar uma estrada de terra por 15 quilômetros. Para alguém dirigindo um carro, não parece algo absurdo. Mas teve carreta de equipe que tentou entrar pelo asfalto e não conseguiu contornar as esquinas de um pequeno vilarejo chamado Padre Fialho, que fica antes de Pedra Bonita. Teve que voltar, fazer um contorno de 80 quilômetros, para então chegar a pista.

Isso é ruim porque reflete na segurança, como veremos mais abaixo.

 

:: Pista

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Sem área de escape, problema grave – Foto: Mau Haas / BRMX

 

A opinião é quase unânime entre os pilotos. A pista de Pedra Bonita é divertida, mas muito perigosa. O espanhol Carlos Campano chegou a dizer que é uma boa pista de treino, mas que nela – nas condições apresentadas neste ano – é impossível se realizar uma prova de campeonato brasileiro.

O maior problema eram as retas opostas que passavam muito próximas umas das outras, sem área de escape, ainda mais que a pista é de tocada veloz, com chão duro e cheia de descidas. O perigo de um piloto se desgovernar em alta velocidade e bater de frente com outro atleta vindo na reta contrária é grande. E um acidente nestes moldes seria muito grave.

O traçado é bonito, divertido, tem uma largada muito bacana (mais interessante do que todas as largadas das pistas do ano passado), saltos bonitos de se ver como o duplo do topo da pista, tem subidões, descidões, os pilotos podem encher a mão, liberar o motor. Tudo isso seria lindo, se não fossem as “retas grudadas”, divididas quase com a mesma fita de limitação – veja a foto acima e entenda melhor.

 

:: Segurança

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Pilotos da MX2 sentados esperando a decisão de correr ou não a segunda bateria – Foto: Mau Haas / BRMX

 

Foi neste aspecto – o mais importante – que a etapa de Pedra Bonita afundou. Por causa do difícil acesso, levar de carro/ambulância uma pessoa de Pedra Bonita (cidade sem hospital) para o hospital mais próximo (em Carangola, a 50 Km pelo acesso da estrada de terra), é um trabalho árduo e, dependendo do estado de saúde do atleta, pode ser fatal.

Motocross é um esporte de alto risco. E a pista, neste caso, ajuda as coisas ficarem ainda mais temerárias. Portanto, é fundamental ter um helicóptero de resgate de prontidão ao lado do circuito de Pedra Bonita.

E nisso faltou preparação da organização. Faltou vislumbrar os problemas antes deles acontecerem. Se deu um jeito no fim, e as coisas foram feitas com prudência (o helicóptero chegou no domingo e a programação foi refeita e em parte cancelada por falta de segurança), se evitando danos ainda maiores.

Na quinta-feira que antecedeu a prova, quando o BRMX chegou à pista, o organizador local disse já havia contratado um helicóptero. E todos entenderam que seria um helicóptero de resgate, obviamente.

Mas na sexta-feira, quando os pilotos chegaram e se deram conta de onde estavam, e alertaram para a necessidade de um helicóptero, começou o tumulto. >> Leia a reportagem do dia.

E no sábado tudo precisou ser cancelado porque os dois helicópteros que pousaram ao lado da pista não poderiam resgatar ninguém – leia mais detalhes AQUI e AQUI. Somente no domingo o problema foi sanado, mas aí tudo virou correria porque seria necessário cumprir a programação de dois dias em um.

Se os organizadores tivessem providenciado um helicóptero de resgate desde o início, a etapa teria transcorrido com mais calma. Sim, mesmo com helicópteros existiam riscos, mas eles sempre existirão neste esporte. Vale ressaltar que havia equipe médica com duas UTI móvel mais três ambulâncias de remoção no local. Neste aspecto, a organização foi bem.

O que não pode é fazer uma etapa de campeonato brasileiro em um lugar tão remoto, de acesso tão dificultoso, sem hospital, onde quase não funciona celular (havia sinal da Claro em alguns lugares). Comunicação é imprescindível em eventos deste tamanho e risco. Todos precisam manter suas famílias informadas, seus patrocinadores. Dois ou três telefones públicos (o famoso “orelhão”) poderiam ter sido instalados no local, e isso ajudaria.

Pilotos, mecânicos e demais trabalhadores do campeonato tiveram que pedir o sinal de internet da sala de imprensa ou da secretaria de prova emprestado para poder se comunicar com familiares, dizer que estavam bem, que não haviam tomado um tombo feio.

Há que se prestar atenção nestes detalhes.

 

:: Estrutura local

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Vista parcial “das costas” do box – Foto: Mau Haas / BRMX

 

O Parque das Cachoeiras, onde está a pista de Pedra Bonita, é um lugar de beleza natural singular. Cercado de montanhas, cortado por um riacho e suas cachoeiras, tem um dos cenários mais belos do Brasileiro de Motocross dos últimos anos (perdendo, talvez, apenas para a Aracaju, que tem uma pista à beira do mar).

A organização se preparou bem em alguns aspectos. Máquinas trabalharam na encosta do morro que cerca a pista para criar uma espécie de arquibancada natural, onde até carros puderam estacionar e dali, sentadas no capô de seus automóveis, muitas pessoas puderam assistir as corridas, tendo grande visibilidade do circuito. Tendas foram montadas nestas encostas para fazer áreas vips e uma cerca de madeira bem montada mantinha uma distância segura entre público e pista, o que também é fundamental.

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Arquibancadas naturais e áreas vip – Foto: Mau Haas / BRMX

Isso deu uma atmosfera interessante ao evento, um clima mais descontraído, mais motocross europeu, onde o público circula em volta da pista e vibra na cerca, em pé, pulando, podendo se deslocar caminhando para ver a prova de diferentes ângulos.

O publico compareceu em bom número. A organização local falou que 15 mil pessoal compareceram. Apesar da impressão que tinha menos pessoas do que isso, o visual estava bonito, como se pode comprovar pelas fotos. Estamos falando de um bom público, até surpreendente para o local da prova e pelo tamanho da cidade e pelo preço do ingresso, que era R$ 20 por pessoa para cada dia.

Também havia caminhão pipa para molhar a pista, além de uma irrigação (um tanto precária) já instalada na pista, e uma grade para gradear e soltar um pouco a terra. Elementos básicos, mas devem estar lá.

 

:: Box

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Carretas se aglomeraram na parte baixa do Parque das Cachoeiras – Foto: Mau Haas / BRMX

 

Outro problema da etapa. Algumas equipes ficaram “amontoadas” em uma área baixa do Parque das Cachoeira e outras ficaram no meio do bosque, com uma base plana, mas um tanto “escondidas”.

A energia elétrica do local não aguentou e caiu diversas vezes ao longo do fim de semana. Não haviam tomadas suficientes para todas as equipes e chegou a faltar água em alguns momentos. Sem falar que “os deuses do motocross” foram generosos e não deixaram chover, porque em caso de chuva dificilmente uma carreta daquelas ou motorhomes maiores conseguiriam sair do local por causa de uma subida bastante íngreme. Na segunda-feira pós-rodada, caía uma fina garoa pela manhã, e a carreta da Honda precisou ser rebocada por um trator para sair do box.

 

:: Dentro da pista – MX1

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Balbi comemora vitória na primeira bateria – Foto: Mau Haas / BRMX

 

Balbi Junior voltou a vencer uma etapa de Brasileiro de Motocross, algo que não fazia desde 28 de julho de 2013, quando ganhou a quinta etapa do campeonato, em Lauro de Freitas, Bahia. Isso empolgou o público e animou os fãs brasileiros, que convivem com a hegemonia gringa dos últimos anos.

O mineiro e Carlos Campano foram os melhores do fim de semana. Não por acaso foram eles que venceram as baterias da MX1. Jetro Salazar foi rápido, mas não tanto como na abertura, e Jean Ramos andou bem, dando trabalho aos dois vencedores nas duas baterias. Outro brasileiro que se destacou, mesmo correndo com ânsia de vômito por causa de uma intoxicação alimentar, foi Wellington Garcia.

A grande decepção do domingo foi o norte-americano Kyle Regal, que recém-chegado ao Brasil apenas passeou na pista. Ele disse depois que não se adaptou ao terreno, que a suspensão trazida da Terra do Tio Sam era dura demais, que jamais tinha visto uma pista como aquela, e que não conseguiu mostrar todo seu potencial. Tomou volta até do décimo colocado.

Os pilotos, no geral, foram prejudicados porque só puderam treinar no domingo em decorrência da falta de helicóptero no sábado. Assim, não puderam encontrar o melhor acerto para as motos de acordo com a pista, nem conhecer melhor os detalhes do traçado.

E, não poderíamos deixar de citar o acidente de Leandro Silva, ocorrido na segunda bateria. Pelo menos o helicóptero da Unimed estava lá para fazer o resgate e o piloto vai se recuperar.

 

:: Dentro da pista – MX2

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Paulo Alberto foi penalizado depois da prova em 30 segundos – Foto: Mau Haas / BRMX

 

A categoria das 250 teve apenas uma bateria também por causa da falta de helicóptero. Como a aeronave precisou sair do local para levar Leandro Silva para o hospital, não havia helicóptero de resgate nem tempo hábil (o sol estava baixando) para largar a segunda corrida.

Na corrida que aconteceu, Paulo Alberto teve o mesmo desempenho de sempre: redondo, poucos erros, veloz. Mas Thales Vilardi também andou muito bem e acabou herdando a vitória por causa de um erro de Paulo, que saltou no duplo enquanto não podia por causa da bandeira amarela agitada.

Hector Assunção, que venceu a primeira etapa, andou forte também depois de uma largada ruim. Fabinho Santos fez uma prova sólida após uma bela largada e Dudu Lima, ainda com moto do ano passado, conseguiu terminar em quinto.

Dudu Lima deve crescer no campeonato a partir da próxima rodada se juntando a Paulo, Hector e Thales na briga pelas primeiras posições.

 

:: Número de participantes

Vamos acompanhar ao longo do ano qual etapa terá maior número de participantes. Consideramos apenas os que alinharam no gate para pelo menos uma corrida. Vale lembrar que alguns, como Enzo Lopes, estão inscritos em duas categorias. Confira os números de Três Lagoas.

Três Lagoas, Mato Grosso do Sul
MX1: 22
MX2: 39
MX3: 35
Júnior: 40
65cc: 23
50cc: 19

Total: 178

Pedra Bonita, Minas Gerais
MX1: 16
MX2: 34
MX3: 25
Júnior: 30

Total: 105

 

:: Avaliação geral da etapa

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No sábado, ninguém entrou na pista com moto – Foto: Mau Haas / BRMX

 

Pedra Bonita será lembrada para sempre como “a corrida do helicóptero”, portanto, o que aconteceu fora da pista se sobressaiu do que o que aconteceu dentro da pista. Os acertos da organização (entorno da pista, preparo das áreas do público, maquinário disponível, ambulâncias) foram ofuscados pelo erro grave no descuido com a segurança dos pilotos, dentro da pista por causa do traçado perigoso, e fora dela pela falta do helicóptero de resgate, além das outras falhas como a falta de energia, água e comunicação.

É incompreensível uma cidade com infra-estrutura tão precária receber um evento deste porte. Não é preciso levar as corridas para grandes cidades, mas os locais devem ter bom acesso, hospital próximo e de rápida recepção, recursos disponíveis, além de pista segura e todos os itens citados acima. Ou então a organizadora tem que levar estes recursos até o local. No domingo faltou internet durante as provas. Mais de 30 minutos foram necessários para que a conexão voltasse, o que prejudicou quem estava tentando passar informação sobre as corridas, seja imprensa ou até mesmo a própria CBM, que pela primeira vez disponibilizou os resultados em tempo real (live timming).

Cabe a CBM orientar e fiscalizar melhor os organizadores locais que, às vezes, não carregam consigo a responsabilidade e a experiência que a entidade maior do esporte tem. No caso de Pedra Bonita, a CBM deveria ter vetado previamente as partes perigosas da pista (principalmente as sem área de escape). Deveria ter exigido mudanças nestes pontos. Roberto Boettcher, diretor de Motocross da entidade, é muito experiente e responsável, e deve ter autonomia para tais tomadas de atitudes. Talvez deva passar pelos olhos dele uma vistoria prévia das condições de corrida, o que deve ser feito com antecedência, para se prevenir de futuros danos, que acabam afetando a todos, inclusive os próprios organizadores. Deveria também ter se atentado para a questão da comunicação, disponibilizando pelo menos uma rede de internet para o box ou telefones públicos. E água e energia elétrica, itens que jamais podem faltar.